domingo, 1 de agosto de 2010

Sem rótulos.

Antes dos dezoito anos todos cobiçam alcançar essa idade, com a doce ilusão de toda liberdade conquistada com a maioridade. Depois dos quarenta, o discurso mais ouvido é sobre a saudade que a juventude deixou. Com os poetas românticos altamente saudosistas, descobrimos uma tendência do ser humano de olhar para o passado como se fosse melhor do que o presente e depositar no futuro todas as esperanças para uma vida melhor. Poucos percebem, porém, que ao desvalorizar o momento presente em detrimento de uma idolatria ou idealização de outra época qualquer se está, na verdade, perdendo tempo produtivo de vida. Cabe analisarmos os fatores, principalmente externos, responsáveis por tal fato.

Primeiramente, é importante perceber a evidente contradição existente na atualidade. Vive-se em uma sociedade extremamente hedonista que preza o prazer imediato a qualquer custo, vide o envolvimento de jovens com drogas, por exemplo, o que prova que há uma sede por aproveitar o momento. Porém, esse valor árcade do Carpe Diem vai de encontro com uma violência cada vez maior nas grandes cidades, o que serve de argumento para aqueles mais velhos, que costumam lembrar como nas suas juventudes tudo era mais fácil e mais seguro, logo, aproveitavam mais. Aliado a isso, as grandes revoluções tecnológicas e na medicina diariamente prometem e cumprem verdadeiros milagres, criando uma grande expectativa de um futuro melhor. Percebe-se, assim, que as pessoas nunca estão satisfeitas com o momento presente.

Além disso, cabe concedermos à mídia seu papel em tal problemática. Percebemos que os meios de comunicação em massa costumam dar um valor exacerbado à juventude, glorificando esta como a melhor fase da vida. Vende-se a idéia de que, quando jovem, somos mais capazes, saudáveis, bonitos e podemos revolucionar o mundo. Conseqüentemente, as pessoas acabam pensando que essa é a melhor fase da vida, e dão uma ênfase somente à juventude, como se a infância fosse apenas uma fase antecedente que deve logo terminar, e a velhice, a decadência da vida. Poucos percebem que cada etapa possui sua importância e beleza individuais.

Não se pode esquecer, ainda, que vivemos em uma sociedade capitalista, que confere à posses e status a maior importância possível. Em busca sempre da maximização dos lucros, há uma necessidade enraizada nessa mesma de inferir rótulos a tudo. A partir disso, temos o que é pior ou melhor, mais bonito e mais feio, mais válido ou menos válido, e isso vai desde objetos e posses materiais até o que é mais subjetivo e por vezes etéreo, como caráter, dignidade e, logicamente, fases da vida. Assim, passamos mais tempo tentando definir a melhor delas, enumerando as qualidades e defeitos de cada uma, do que de fato tentando aproveitá-las.

Dessa forma, nada mais justo afirmar que a humanidade, especialmente no contexto vigente, está deixando a vida escorrer em suas mãos sem perceber. O ser humano tende a não refletir sobre o seu presente, valorizando o passado e idealizando o futuro. Porém, seria ignorante e ineficaz comparar a inocência de Narizinho, o crescimento de Capitu e o conhecimento de dona Benta. Melhor do que isso é viver o agora, para que, ao olhar o passado não haja remorso ou vontade de retorno, e sim a saudade de uma fase boa. De todas elas.

Um comentário:

Bel disse...

Humrum!

Foi por isso que falei que somos bem maiores que a nossa história...

"De uma perspectiva mais elevada, as circunstâncias são sempre positivas. Para ser mais preciso, elas não são positivas nem negativas. São do jeito que são. E quando aceitamos as coisas como são, o 'bem' ou o 'mal' deixam de existir em nossas vidas."