quarta-feira, 11 de junho de 2008

O sexo, a cidade, e eu.

Costumo reclamar com freqüência que, desde que entrei na faculdade de Cinema, perdi o encanto com ele. Não consigo mais assistir a um filme sem pensar no posicionamento de câmera, no enredo, na atuação do ator, na direção de arte, nos efeitos óticos possivelmente usados. Em todos os aspectos técnicos que os profissionais - e aprendizes a tal - precisam dominar para que o grande público jamais perca o tal encanto. Aprendemos que o cinema chamado clássico-narrativo, que Hollywood nos acostumou a assistir e consumir, tem como grande trunfo e característica “esconder” suas artimanhas técnicas cinematográficas, ou seja, tornar invisível ao máximo que aquela cena específica só foi possível com o trabalho de dezenas de pessoas e uma infinita parafernalha por trás das câmeras. Não há câmeras nesse cinema, somente os nossos olhos, observando um mundo que não nos pertence, mas que nos envolve, como um voyer ao espiar pelo buraco da fechadura. Ainda assim, em raras ocasiões, felizmente, consigo me sentir leiga. E isso acontece quando o estigma de quase-graduada dá espaço a uma personalidade mais avassaladora: a de fã incondicional. Foi assim que me senti hoje quando, sozinha, no meio da tarde, me acomodei em uma poltrona para assistir ao meu quarteto preferido de amigas, que eu não via há quatro anos, e que fiquei tão feliz ao descobrir que elas continuam, apesar das mudanças do tempo, essencialmente as mesmas. Porque é assim desde que eu assisti ao primeiro episódio de Sex and the City, ainda na televisão, e eu jamais poderia deixar de dedicar uma crônica à elas. Para mim, era muito mais do que uma série, um simples entretenimento. Durante anos, assistir os questionamentos, conversas, sexos, casos, dilemas de Carrie, Miranda, Charlotte e Samantha era quase como uma terapia, e elas eram as analistas profissionais que eu não precisei pagar. Por meio delas eu aprendi não a entender os homens e os sentimentos, mas a aceitar que é impossível entender algo que escapa da lógica convencional e obedece às loucuras que somos capazes de sentir. Quando a série acabou, sem exagero, foi como se algo faltasse para mim. Aquele encontro semanal que não mais existia doía no meu cotidiano. Mas o filme compensou o tempo de espera, e a saudade que eu senti. E aqui digo com nenhum olhar crítico. Me rendi, hoje, aos encantos da ignorância. Fui como devota de Bradshaw, e assim permaneci durante quase duas horas e meia. Quatro anos depois, Miranda ainda mora no Brooklyn e é a mãe de um menino ruivinho, aquele que eu vi na barriga dela, aquele que eu vi estragar o Christian Louboutin da Carrie quando a bolsa estourou. Charlotte, ainda casada com Harry, também é mãe, mas de uma menina chinezinha linda que aprendeu a falar “sex” com a tia Samantha. Esta, sempre fabulosa, está morando em Hollywood com o Smith, e vive no avião para Nova York, visitar as amigas. Aliás, uma breve interrupção para mencionar Nova York: linda com o passar das estações, glamurosa e cheia de vida. E Carrie, três livros depois, está com ele .... ele que fez milhares de mulheres suspirarem por 6 anos, ele que, chorando, foi até Paris dizer “you’re the one” para ela, ele que só viemos a descobrir no final que se chama John, mas que para nós será sempre o Mr. Big. E um fabuloso desfile de marcas, roupas, bolsas, acessórios, muitos e muitos sapatos. Tudo infinitamente mais fabuloso, do jeito delas. Só no primeiro final de semana, Sex and the City, the movie, arrecadou 55 milhões de dólares só nos EUA. Méritos para o incrível merchandising, que não poupou um meio de divulgação. Porém, mais do que isso, encontra-se no segredo do sucesso da série o sucesso de bilheteria. Talvez o motivo maior, ou pelo menos o mais evidente, para mim, do fenômeno que Sex and the City foi, e continua sendo, se encontra no fato de que cada uma das personagens se enquadra perfeitamente na “girl next door”. Não são super modelos, super heroínas, estereótipos ilusórios com os quais a mulher comum jamais conseguiria se identificar. Sarah Jéssica está longe de ser um modelo de beleza. É miúda, magrela e nariguda. Ainda assim, conquistou nossos corações, pois vimos nela a sinceridade que faltava nas personagens femininas da TV, já que ela passava por tudo aquilo que nós passávamos, e ainda falava, pela primeira vez, abertamente sobre sexo e outros assuntos tabus. E tudo isso ainda está lá, com um toque a mais que a maturidade e o dinheiro trazem. Por essas e outras que foi tão bom revê-las, como se fossem velhas amigas, e saber que estão bem, estão lindas, e estão tocando suas vidas. Elas existem, eu sei, no mundo infindo da imaginação e do glamour. Sei também que não posso mais encontra-las semanalmente com casos novos a serem contados e revelados, mas para sempre elas terão, cada uma a seu jeito, marcado a juventude de uma garota que pode até estar longe de NY, dos Manolos e dos Cosmopolitans, mas que, como sua musa, sente a mesma emoção sem culpa com um novo par de sapatos, o mesmo deleite de ter amigas divertidas e ouvintes, e principalmente, a mesma infinidade de interrogações na cabeça ao se deparar com uma tela branca de notebook, a espera de ser preenchida com palavras e mais palavras que nada mais são do que questionamentos verdadeiros, e que, provavelmente, nunca serão respondidos.