terça-feira, 18 de maio de 2010

Em defesa do fútil.

Um museu em Nova York está fazendo uma exposição sobre moda. O que essa frase teria para intrigar qualquer pessoa? Nada demais, concordo. Mas me intrigou. Fiquei pensando naquilo e descobri um problema enorme por trás da minha própria estranheza. Depois, achei melhor nem ter pensado nada. É sempre vergonhoso quando descobrimos um sentimento chato por trás de uma impressão, aparentemente, inocente.

Museu, para mim, é um lugar quase sagrado. Aquelas paredes guardam obras de valores incontestáveis, inestimáveis, essenciais para contar a história da humanidade por meio da arte. Arte, tão cheia de importância pra mim, seja lá qual for sua forma de expressão. A arte que tanto valorizo e prezo, que tão acima está das coisas mundanas e banais. Do outro lado, está a moda. Talvez pelo meio onde obtive a maior parte da minha orientação intelectual, fui educada a achar a moda uma grande bobagem. Uma futilidade, coisa de quem não tem muito o que fazer. Afinal, o tempo que você fica escolhendo uma roupa, um sapato e uma bolsa que combinem, poderia estar sendo mais produtivamente utilizado, ou seja, você poderia estar criando uma grande obra que mudaria a maneira como as pessoas enxergam o mundo, o universo e todo o resto. Além disso, a tal "moda" nada mais é do que uma lista de mandamentos formulada por uma meia dúzia de pessoas - e, convenhamos, nenhuma delas mora nessa nossa terrinha - que dizem o que se "pode" e o que "não se pode" usar. Um dia, calça de cintura alta é a última tendência. Daqui a uma semana, pode não ser mais. E mais e mais pessoas compram itens com os preços nas alturas, que certamente não valem em seus processos de fabricação nem um terço do que por eles é cobrado, para usarem o que a galera mais cool do planeta tambem está usando. Só para serem aceitas, para pertencerem ao seleto grupo daqueles que podem dar oitocentos reais num par de jeans ou dois mil numa bolsa. No meio acadêmico daqueles que, como eu, estudam comunicação ou artes, e se acham, por isso, grandes formadores de opinião, os portadores de tantas respostas, a moda é um meio fútil de gastar tempo útil e, pior ainda, é uma ditadura quase religiosa e que, veladamente, junta um número cada vez maior de ovelhinhas desgarradas e cegas.

Sim, eu tinha essa opinião formada e muito forte. Mas depois que você fica um pouco mais velho e, portanto, mais exigente, passa a achar esses pré-conceitos muito chatos e, por si só, fúteis. Com tantas coisas maiores dignas de preocupação, o que é se preocupar com o que a Lindsey Lohan usa ou deixa de usar? E, afinal, qual é o grande problema da futilidade? Futilidade pode ser uma coisa boa, se bem dosada. Afinal, todo mundo precisa de breves momentos em que não é preciso ser absolutamente brilhante, ou estar trabalhando em algo realmente transformador. Homens e mulheres, há momentos em que tudo que precisamos é nos sentir bem, e a tal da moda surte esse efeito. Não a moda ditatorial, não o "ter que" ter isso ou aquilo. Mas todo mundo gosta de se sentir bonito, elegante, atraente. E essas mesmas pessoas que tanto criticam as outras que se preocupam com o que vão vestir, passam o mesmo tempo na frente do espelho tentando desconstruir uma imagem, digamos, mais aceita. E aí fazem tudo para chocar: usam cortes de cabelo diferentes, roupas esquisitas, combinações propositalmente conflitantes. Mal sabem elas que tambem estão seguindo mandamentos, só não são os mandamentos que saem na Vogue.

Hoje estou mais livre de preconceitos em relação à moda. Simplesmente porque entendi que, só porque ela existe, não quer dizer que eu precise segui-la piamente. Essa indústria que move bilhões todos os anos e envolve milhares de trabalhadores que passam, sim, horas enfurnados em escritórios pensando qual será o tom de verde da próxima estação, tem lá suas qualidades e méritos. Afinal, não podemos exatamente dizer que vivemos em uma sociedade que valoriza a beleza interior. Essa exposição de Nova York mostra, em um certo período de tempo determinado pelo curador, a evolução das roupas femininas, de acordo com cada época. Tem as dondocas do Novo Mundo lá dos idos de outros séculos, as feministas, as mulheres que lutaram pelo direito do voto, as estrelas hollywoodianas cheias de glamour. Essa exposição tambem conta um pouco da história da humanidade através das roupas. Assim como a arte o faz. E, convenhamos, quem é capaz de dizer que certos vestidos do Valentino não são verdadeiras obras de arte?

Continuo sendo contra a adoração desenfreada do "must have". Assim como sou contra qualquer determinação que não seja criticamente pensada pelo indivíduo. Se a Anna Wintour um dia disser que a última moda é usar casaco de pele no verão carioca, posso garantir que vai ter uma galera desidratada por aí, mas se sentindo super in. Eu estarei usando meus shorts e camisetas de sempre, porque simplesmente não sinto a menor necessidade de seguir cegamente esses preceitos. Mas gosto, sim, de comprar uma bolsa bonita, um par de sapatos que tenham o poder, sozinhos, de fazer com que me sinta no topo do mundo. Defendo a liberdade de escolha, mas se alguem escolhe seguir os mandamentos da moda, quem sou eu para julgar? Cada um no seu Manolo.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Não se atrase para o chá!



As vezes me parece que a relação do público cinéfilo intelectualizado com o diretor Tim Burton é de amor ou ódio. Há quem o ache genial em sua excentricidade crônica, e que já vai ao cinema predisposto a achar um novo filme de sua autoria, senão o melhor da carreira, bastante superior ao que tem aparecido por aí no Cinema Hollywoodiano. Há, por outro lado, aqueles que o acham simplesmente um louco que nada de novo tem a acrescentar à arte, e não desperta muita coisa além de preguiça. Embora encaixe-me no primeiro grupo, sei que Burton conta com trunfos que o ajudam em seus sucessos. "Alice no País das Maravilhas" (Alice in Wonderland, 2010) não é o melhor filme de sua carreira. Apesar da história perturbantemente interessante, recheada de belos cenários e boas atuações (fora o furor que o 3D tem causado), ele ainda não chega aos pés de trabalhos como "Os Fantasmas se Divertem" (Beetle Juice, 1988), "Edward Mãos de Tesoura" (Edward Scissorhands, 1990) e "Peixe Grande" (Big Fish, 2003). Burton é, talvez, o diretor moderno mais bem preparado pra contar o clássico de Lewis Carrol, pois parece entender o mundo fantástico criado pelo autor e sentir-se em casa nele, sem apelar para a transmissão de mensagens chatas e valores que pouco interessam ao grande público, sedento por espetáculos.

Johhny Depp, como o Chapeleiro Maluco, faz qualquer crítico de Cinema se repetir. Ele é constantemente bom e, mais uma vez, rouba cada cena na qual aparece. Helena Boham-Carter nos delicia com uma firme e engraçada Rainha de Copas, já Anne Hathaway esteja fraca e piegas em sua flutuante Rainha Branca. Já a protagonista, Mia Wasikowska, é boa e responde bem ao que lhe foi proposto, embora não seja dona de um carisma arrebatador. Para um diretor que consegue não vender seu estilo e estética, Burton parece ter se vendido ao fenômeno do 3D. O filme passaria absolutamente bem sem o recurso, que por vezes parece estar lá mais como uma distração e uma obrigação. É sabido que o diretor não se adaptou ao equipamento usado por James Cameron na filmagem de "Avatar" (2010), e o processo de terceira dimensão foi quase que totalmente feito na pós-produção. As melhores obras de Burton não contavam com tais aparatos e eram absolutamente geniais, pautando-se no que de mais básico o Cinema realmente precisa pautar-se, como atuações, roteiro e fotografia. Além, é claro, da batuta de um grande Mestre.

Ainda assim, "Alice" é, como sempre se pode esperar de Burton, um filme interessante e um ótimo entretenimento, que passa longe de produções insossas e inconsistentes. A maior bilheteria de Disney até o momento promete merecidas indicações aos prêmios mais técnicos do Oscar, como maquiagem e efeitos visuais. E, se a Academia for justa dessa vez, não deixará de premiar Depp, que há muito já deveria possuir um homenzinho de ouro.