segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Carolina vesus a Gripe A.

Quando tinha uns onze anos, li um livro chamado “O Diário de um Adolescente Hipocondríaco”, e tive um daqueles momentos de revelação na vida. Descobri que aquilo que eu era não era um surto particular meu, e que tinha um nome e mais um monte de gente igual a mim. Sempre achei muito esquisita a minha mania, que existe desde que me entendo por gente, de andar bom uma bolsinha de remédios na bolsa. Ando sempre com Tylenol, Tylenol DC, Postan, Buscopan, Engov, Fluviral, Luftal e Plasil, além de pacotinhos daqueles de sal que todo mundo rouba de mesas de restaurante, para caso a pressão baixar. Na gavetinha da minha mesa de cabeceira, bem ao lado da minha cama, tenho a postos um termômetro e um pote de Passiflorine (calmantezinho leve pra dormir, coisa besta, tenho insônia quando fico nervosa). A qualquer pequeno sinal de alteração na minha temperatura, já coloco o termômetro para me certificar de que está tudo bem. No primeiro espirro, quando a garganta começa a arranhar, não hesito e entro logo no antibiótico. Não consigo conceber como algumas pessoas simplesmente suportam ficar sentindo dor física, principalmente aquelas que podemos evitar, como uma dor de cabeça ou dor de dente. E nada disso por ser extremamente cuidadosa com a minha saúde, afinal eu sou uma fumante. Acho que sou só meio freak mesmo. Mas assumo minha hipocondria como outros assumem que são viciados em sexo, alcoólatras, adoradores de seitas estranhas, ou fãs dos Jonas Brothers. E vivo bem assim.

Diante desse cenário, pode-se imaginar como estou neurótica com essa tal de Gripe A. Acompanho com veemência cada nova informação dos infectologistas nos jornais, e juro que já procurei saber onde vende o tal do Tamiflu. Estou com medo de tocar em qualquer coisa na rua. Demoro duas vezes mais em banheiros públicos, pois procuro não encostar minhas mãos em absolutamente nada. Empurro a porta com o corpo, uso um papel para apertar a descarga e para abrir a porta. Tomo o maior cuidado do planeta em não colocar as mãos nos olhos, boca ou nariz, enquanto estou na rua, porque dizem que se você tocar em algum lugar que alguém com gripe suína tocou, ou mesmo apertar as mãos de alguém com o vírus, e depois encostar a mão em um desses três lugares do seu rosto, já era! A suína te pegou de jeito.
Além disso, chego em casa e, antes de qualquer coisa, lavo muito bem as mãos, ensaboando umas três vezes. Se os médicos estão recomendando, é isso que eu faço. Tenho evitado de ficar em lugares fechados e com grandes aglomerações, olho de cara feia quando alguém espirra ou tosse do meu lado sem o cuidado de colocar a mão na frente, e estou cogitando a possibilidade de comprar um gelzinho pra levar na bolsa. Não parei de viver minha vida, é claro, mas não dou sorte para o azar.

O bicho ta pegando, a coisa ta ficando feia. E tem gente que ainda não se tocou nisso. Uma em quatro pessoas, na população mundial, vai pegar essa gripe. É uma pandemia séria, pior do que a ameaça do envelope com Antrax há alguns anos atrás, ou aquele mito de abrir um pote com varíola em um metrô em Nova York. Porque a Gripe A está bem aí, no nosso vizinho, no amiguinho da escola do seu filho que passou as férias na Disney, no seu colega da academia que foi pra Buenos Aires nas férias. Ela é uma ameaça e uma realidade, e está em todo lugar, se fazendo presente justamente na forma mais simples de doença, que todo mundo lida com naturalidade: uma gripe. Tenho, sim, sérias razões para estar com medo. E é por isso que, hoje, agradeço pela minha hipocondria, pois estou muito mais alerta do que os demais para os primeiros sinais de qualquer coisa errada no meu organismo. A neurose, as vezes, te ajuda a sobreviver.

Por enquanto está tudo bem comigo, e assim pretendo permanecer. Continuo acompanhando as notícias, e torcendo para que os infectologistas encontrem logo uma solução mais imediata, pois se a vacina realmente só chegar por aqui em março de 2010, a coisa vai ficar ainda mais feia. Só posso dizer que, diante de todos esses cuidados, tenho a mais absoluta razão de, se por acaso algo acontecer (toc toc toc, três vezes na madeira), mais do que amedrontada ao máximo, eu vou ficar é bastante irritada. Logo eu? A garota dos remédios na bolsa? Aquela que não sai de casa quando está com febre? Ah não... é muita sacanagem eu pegar a gripe suína! Suína! Logo eu, que sou filiada ao PETA e não como bacon! Desculpa, mas acho que eu mereço um certo desconto. Nada mais justo do que eu estar lá no final da fila, mais imune que os demais.

No mais, permaneço me cuidando, enquanto a suína ronda nossas portas.
And isn't it ironic? Don't you think...?

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Sobre certezas.

Aqui em casa rola uma espécie de clube do livro. Meu pai e eu temos uma mini-biblioteca em um cômodo acoplado à cozinha que, teoricamente, serviria como quartinho de empregada. Lá, guardamos como tesouros grandes livros, clássicos ou não, mas alguns meus, alguns dele – talvez esteja aí uma das origens de minha nerdice aguda. Além disso, meu pai costuma trocar de livros com amigos, numa espécie de escambo intelectual temporário, no qual o livro volta para seu dono original. E não importa exatamente o gênero ou o gosto. Simplesmente eles separam livros que gostaram e emprestam uns para os outros. Funciona, pois assim não se precisa comprar todos os livros que se quer ler (sim, eu sei que isso é um sacrilégio vindo de uma escritora).

Dessa vez, na última rodada de empréstimos, chegou aqui em casa um livro do Jabor. E como eu sou mais rápida no gatilho, já o separei para ler antes que meu pai o pegasse. E tenho devorado as crônicas de “Porno Política – paixões e taras na vida brasileira”, assim como eu devoro todo e qualquer texto ou filme que venha de Jabor. Uma delas, porém, me chamou a atenção de forma especial. E, surpreendentemente, dessa vez não pelo conteúdo. Jabor falava sobre uma de suas paixões e mulheres – ele teve muitas – e discorrendo sobre as entrelinhas e meandros do amor, ele soltou uma definição que me deixou encucada. Ele falou sobre "certezas imediatas".

Fiquei pensando no que seriam essas tais certezas imediatas, quando se trata de amor. E concluí que, na verdade, elas não existem no amor, e sim na paixão. E, pensando comigo mesma, concluí que são aquelas confianças inabaláveis que nos arrematam em toda e qualquer paixão.

Apaixonados, temos a mais absoluta certeza de que aquela não é somente mais uma pessoa, mas "a" pessoa. E que ninguém nos questione sobre isso, pois simplesmente não conseguimos compreender como os outros não conseguem enxergar o que é tão claro para nós. Ficamos absolutamente certos de que aquele beijo é o melhor beijo, aquele abraço é o melhor abraço, que em uma população de 6 bilhões de pessoas no mundo não há ninguém igual aquela pessoa. E que você vai ficar a vida inteira com ela, claro que vai. Simplesmente porque vai, porque é assim que tem que ser, você tem certeza disso. E elas todas, as certezas, vêm com uma rapidez impressionante. São imediatas, afinal. Batemos o olho e sabemos, nada mais é preciso.
Até aí, pode-se dizer que essas sensações são gostosas, e de certa forma até saudáveis. É uma delícia se apaixonar assim, e fazer planos e mais planos. As tais certezas imediatas, entretanto, passam a ser perigosas quando elas começam, pouco a pouco, a nos cegar. Ficamos tão inquestionavelmente certos de que aquilo que sentimos é a verdade absoluta, quase dogmática, que não enxergamos as pequenas e dolorosas falhas nesses posicionamentos tão absolutos. Quando o fogo baixa é quando começamos a perceber que essas certezas não são baseadas em argumentos concretos ou em fatos consumados, mas pura e simplesmente no que sentimos. E como muitas vezes, como já disse o poeta, "as idéias não correspondem aos fatos", passamos a nos perguntar se ainda temos tanta certeza mesmo daquilo tudo. Aos poucos, aquela pessoa tão absurdamente especial, tão incrivelmente feita sobre medida pra você, talvez – talvez mesmo – não seja enfim aquela com quem você vai envelhecer ao lado. E isso porque finalmente assimilamos que, infelizmente, não basta só um lado da história ser tão certo assim quanto a isso. Experimentamos outros beijos e vemos que, ainda que aquele tenha sido delicioso, há outros muito bons também. E, então, quando a paixão esfria, as certezas se esvaem. O que fica, muitas vezes, é uma mágoa que só passa com o tempo, mas acaba passando, eventualmente. As vezes ficam também fotos cortadas, cartas que nunca foram enviadas, e umas tatuagens com o nome dele ou dela em partes sugestivas do corpo, mas nada que umas sessões a laser não curem.

A grande questão é quando a paixão abaixa e as certezas ficam. E, então, elas se modificam um pouco. Elas não são mais tão imediatas, e passam a ser acompanhadas de leves dúvidas. Saudáveis, todavia. Mas ainda assim, permanecem certezas. Ainda sabemos – simplesmente sabemos – que aquela pessoa é especial demais, que ela mexeu conosco de forma única e nova. De que aquele beijo é, sim, talvez não melhor, mas muito mais deliciosamente particular do que todos os outros, até os que ainda não experimentamos. E que, mesmo que talvez, por ironia ou implicância da vida, não casemos com aquela pessoa para sermos felizes para sempre em uma linda casa com filhos e cachorros, isso realmente só aconteceria se desse tudo errado. Preferimos, porém, acreditar que tudo vai dar certo.

O que mudou, então?
O sentimento mudou. A paixão se transformou em algo muito maior, e ainda mais angustiante. Ela se transformou em amor. E no amor, não temos tantas certezas assim. Na verdade, temos muito mais dúvidas, em uma desproporção enorme em relação às certezas dogmáticas. Ainda assim, se somos tão certos quanto a algo que não é racionalmente explicado ou comprovado, mas pautado somente no que sentimos dentro de nós, é porque alguma coisa ali faz sentido. Não se sabe tanto, não se sente tanto, se for a toa.

O tempo – melhor remédio e psicólogo que se pode ter – vai poder dizer se nossas certezas eram coerentes, ou se foram por água abaixo. Enquanto isso, não vejo absolutamente nenhum mal em sentir isso, contanto que não te faça mal. Porque isso é amor, e ao contrário de certas teorias e visões que correm por aí, o amor não foi feito para te fazer mal.

Ter certeza não é um crime. E amar, acredite, não dói.

domingo, 2 de agosto de 2009

Lá vem a noiva.

Casamentos me comovem. É sempre assim. Fico ansiosa esperando a noiva entrar, choro quando ela entra, choro nos votos, choro quando os noivos saem, choro na primeira dança. E estranho a reação estática e fria que muitas pessoas têm a isso. Acredito, inclusive, que nossa sociedade pós-moderna quase nos impõe uma certa dureza, como se a entidade do casamento fosse algo ultrapassado, que já não tem mais valor, que ficou para trás. E que apreciá-la o torna alguém de cabeça fechada, preso a valores antigos, careta. Sinceramente, porém, não ligo nem um pouco pra esse tipo de pensamento atual, porque acho, sim – e sem vergonha de assumir – a instituição do casamento uma das coisas mais bonitas que alguém pode fazer em vida.
Estou escrevendo sobre isso porque ontem fui ao casamento de dois amigos meus muito próximos ao meu coração e muito queridos. E pouco antes de a cerimônia começar, já sentada na simpática e pequenina Igreja São Conrado, me peguei absorta em meus próprios devaneios, e só conseguia pensar a tamanha sorte que tiveram os dois por terem se encontrado. Sim, porque estou longe de acreditar em almas gêmeas, mas em um mundo com bilhões de pessoas, eles se conheceram, e em determinado momento pela vida se olharam e disseram “é com você que eu quero ficar pra sempre”. E ali, naquela noite, aquela capelinha estava repleta do mais sincero sentimento de amor. Não só o dos noivos, mas também dos familiares e amigos presentes, que se dispuseram a sair de casa justamente para celebrar essa união.
Casar é assumir um compromisso para a vida inteira. É abrir mão de um monte de outras bocas, peles, cheiros e sexos porque, sinceramente, a existência deles nem mesmo importa. Só uma pessoa basta. É juntar seu caminho com o de outro para, juntos, trilharem um só. É dividir quem você é com alguém, é somar-se, completar-se. É declarar para o mundo inteiro, e dividir com as pessoas mais próximas, a alegria de ter finalmente encontrado aquele – ou aquela – que você esteve esperando sua vida inteira. E é, acima de tudo, crer no amor e trabalhar por ele, todos os dias. É ter a coragem de arriscar. E fazer dar certo.
Para aqueles que assistem, principalmente os que amam alguém, como eu, não é humanamente possível furtar-se a pensar no dia em que aquela cerimônia estará acontecendo consigo próprio. O dia que chegar a sua vez de gritar para quem quiser ouvir que você, agora, pertence a outro além de pertencer a si mesmo, e que o faz de bom grado. Que você entrega seu coração sem medo e sem receio. Enquanto esse dia não chega, resta-nos ser um pouco abençoados por aquele amor ali presente, um pouco energizados por ele, e em troca abençoar e energizar os recém-casados com os nossos mais profundos sentimentos de carinho, amizade, respeito, votos de felicidades, companheirismo e, como não poderia deixar de ser, amor. Muito amor. Esse sentimento que, embora banalizado nos dias de hoje, é tão magnífico que nem mesmo é possível explicá-lo, cantá-lo ou escrevê-lo, somente vivê-lo. E é o mais próximo do divino que podemos vivenciar aqui.



Obs: Esse texto é dedicado aos meus queridos amigos Maria Victória e Rodrigo. Que o caminho de vocês seja repleto de luz. Que tenham, juntos, uma vida inteira de alegrias, e que ela seja tão bela e feliz como a cerimônia e a recepção de ontem a noite. São os meus mais profundos votos. Um beijo enorme, Cá.